Brasileiro é primeiro latino a ganhar medalha Robert Capa de Fotografia


A Medalha de Ouro Robert Capa homenageia o fotógrafo húngaro radicado na França Robert Capa. Ele cobriu os mais importantes conflitos da primeira metade do século XX, como a Guerra Civil Espanhola, a guerra entre chineses e japoneses, a Segunda Guerra Mundial em vários frontes (Londres, Itália, Normandia, a libertação de Paris), conflitos étnicos no Norte da África, a guerra árabe-israelense ea primeira guerra da Indochina (Vietnã), onde pisou numa mina e morreu, em 25 de maio de 1954.

A cobertura da mais sangrenta rebelião da Primavera Árabe, a guerra civil da Líbia, rendeu a um brasileiro o Robert Capa Gold Medal, um dos mais prestigiados prêmios de fotografia do mundo.

O vencedor da edição 2012 do prêmio – que foi instituído em 1955 – é o paulista André Liohn, 39 anos. Correspondente de guerra freelancer há mais de uma década, já cobriu conflitos na Somália e Síria, entre outros locais.

Ele realiza trabalhos como fotógrafo e cinegrafista para empresas brasileiras ou estrangeiras, como a CNN norte-americana e a organização de defesa dos direitos humanos Humans Rights Watch. Foi para esta última Organização Não Governamental (ONG) que Liohn cobriu do início ao fim o conflito na Líbia. Ele foi premiado por um grupo de 12 fotos tiradas em Misrata, a cidade mais castigada pela guerra, que ficou dois meses sitiada por tropas do ditador Muamar Kadafi, entre março e abril de 2011.



Foi em Misrata que Liohn testemunhou a morte de dois colegas, britânico Tim Hetherington e ao americano Chris Hondros, seus amigos. Os dois morreram em consequência de um disparo de morteiro e seus corpos foram retirados da Líbia por esforço de Liohn, que ajudou a transportá-los de barco para fora do campo de batalha. Ajudou o fato do repórter brasileiro conhecer um pouco do idioma árabe.

Hondros também tinha sido ganhador do Robert Capa Gold Medal, em 2005. Hetherington concorreu ao Oscar com um documentário sobre a Guerra do Afeganistão. Os dois morreram em 20 de abril de 2011 e o próprio Liohn quase foi morto em Misrata, cinco dias depois.

Liohn e um grupo de 10 premiados fotógrafos de guerra criaram este ano o projeto ADIL (Almost Dawn in Libya), que consiste de coleta de fundos para doações aos líbios, a partir da renúncia dos fotógrafos a direitos autorais de fotos feitas na guerra civil líbia.

Eles coletam contribuições de ONGs e também realizam exposições itinerantes com material fotográfico coletado durante a guerra. O objetivo é promover uma reconciliação do povo líbio, tanto que as fotos contam com colaboração de jornalistas que cobriram os dois lados em conflito.



Desde Nova York, onde está para receber o prêmio, Liohn concedeu por skype esta entrevista ao jornal Zero Hora:

Zero Hora — Este é o maior prêmio da sua carreira?
André Liohn — É o mais importante. Creio que é o mais importante prêmio de fotografia de guerra, no mundo. É uma honraria e tem muita importância para a nossa profissão. Sou o primeiro sul-americano (e o primeiro brasileiro) a ser contemplado com a medalha Robert Capa em 57 anos de prêmios. Espero que isso sirva para que, no Brasil, o fotojornalismo ganhe impulso mais crítico e independente. Tem muita gente fazendo trabalho bom por aí, mas tem de sair do país, para ganhar um bom espaço. Fotojornalismo não é apenas cobrir pauta e voltar para casa horas depois. Nem precisa ser devaneio estético. Pode ser um meio termo, um bom trabalho de pesquisa, que retrate uma cultura em meio ao conflito.

ZH — Um dos últimos vencedores desse prêmio foi o Chris Hondros, fotógrafo a quem você ajudou nos últimos instantes de vida. Isso lhe diz algo?

Liohn — Dia 20 fez um ano da morte do Chris e dia 25, quando recebo este prêmio, faz um ano que eu próprio quase morri. São coincidências intrigantes.

ZH — Como está o projeto ADIL, de ajuda à Líbia?
Liohn — Procuramos ir além do jornalismo. Viramos interlocutores da reconciliação dos líbios, é uma tentativa de contribuir para isso. É um projeto novo e ambicioso. Dia 7 de maio volto à Líbia, imprimo catálogos e começo a montar a exposição itinerante. Será bom para os líbios voltar à vitrine internacional, agora de forma positiva. A situação lá melhorou bastante, embora existam algumas escaramuças.

ZH — Quais seus planos imediatos de cobertura de guerra? Síria?
Liohn — Estive na Síria em dezembro. Agora não dá para ir, nenhuma empresa está bancando, em decorrência dos riscos para os repórteres. O que é triste...O povo sírio precisa da presença da imprensa. Aquela história precisa ser documentada. E sem apoio de jornais ou TVs, não penso em retornar. É difícil enfrentar riscos, sem sequer a certeza de vender o material e ter um apoio logístico.

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